quarta-feira, 2 de novembro de 2011

A Formatura nos Bancos e a Disputa das Bancadas pelo Depósito!


Nestes dias, dias do verão, em que o sol sobe antes de os ponteiros do relógio roçarem acima da hora cinco, hora da matina, hora da marcha para a manuntenção do corpo e da mente – para os que desses hábitos vivem, encontro estateladas figuras humanas que a princípio pareciam mendigos, pedintes ou moldura humana que se ergue em qualquer labirinto à caça de um sossego para uma ou mais noites despidas de abrigo. Mas, com a força maior do olho que não se vence de todos tipos de pobreza conferi que eram homens e mulheres de todas as idades, fazendo-me lembrar os anos da bicha, em que bicheiros murchavam na fúria de obter uma vertigem de esgotamento do pão, arroz, farinha celeste ou qualquer outro produto. Coisas do tempo, tempo sem nada, pasmado de miséria na luta pela edificação de uma nova nação, nação popular, nação do povo que morria de euforia de liberdade, nacao que outros homens, homens destes tempos a destroem na pinga de desgovernação. Que liberdade?! Que respondam as outras gerações. Mas que faziam essas figuras humanas pela matina? A bicha, a formatura do banco, a disputa pelo primeiro lugar, lugar que o funcionário  do banco vezes transforma num mistério em que o último sempre se torna primeiro. Enfim, alguns falam de costas quentes, outros falam de cunhas, outros ainda falam de influências...falam... mas isso não interessa, interessa é a bicha, que 2 a 3 horas antes de o estabelecimento abrir já ocupou os lugares dos que chegam em último para primeiros. Assim vai o mundo, consequências de globalização? Ou de desenvolvimento? Ou de redesenvolvimento? Estão na bicha, bicha que também fico, horas e horas apenas para depositar ou tirar algum valor. Mas que sofrimento? So por dizer! Tudo é preciso sofrer, é preciso sacrifício mesmo que os resultados não benefeciem directamente a si, mas é preciso sofrer, sofrer, sofrer, sofrer como se a lei do enriquecimento fosse proporcial ao sofrimento. Mas é preciso sofrer, que até para Deus te ouvir é preciso botar seu suor no altar. Ai sim! Afinal, que se passa contigo banco que estás no Shopraite de Nampula? Será que os sistemas ficaram afectados com a força do fogo que deflagrou aquele supermercado! Ohhh, banco, banco, banco que especta sofrimento para multidões, multidões que humildemente tornam-te banco de renome. Até quando esse sofrimento, essa madrugada que seus clientes varrem os arredores da agência com rabos esquentados na ordem da bicha???

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Adeus Inhambane

Do horizonte mágico da baía vazadas foram as lágrimas de dores que inundavam-me entre as madrugadas e os lindos pôr-do-sol das tardes de Verão, embriagando-me de melancolias sorvidos de cálices de pensamentos de um passado solitário, no pacto de entender a dor como um mal necessário para moldar a bravura das ondas do meu Índico cerebral;

Com os barcos a tagarelarem no artelier artístico das águas no vaivém de uma margem para a outra, aprendi a contemplar o sofrimento e a coragem das mulheres que em todas as madrugadas debaixo da escuridão, da chuva ou do frio atravessam o horizonte do vazio empunhadas de canhões de pesca nas mãos, da enxada no ombro, de qualquer material na cabeça e de enxertos da humanidade no colo em busca da arte para florar as larreiras da vida;

Com o inocente sol vermelho a despedir-se da melancolia dos rostos indecisos do outro dia ao encontro de corpos moribundos vagueando no duplo escuro de noites sonâmbulas, aprendi a enxergar lágrimas de dores de crianças que saiem de um ventre, e meia-volta não têm ventres externos, abrigos, educação e saúde condignos...obrigadas a transformarem-se em qualquer profissional – que os sem escrúpulos exploram-nas em troca de nada senão ainda mais miséria que sequer no mínimo enchem-lhas as panças! Oh, crianças, criaturas do santo Deus cadê a omnipotência do senhor para salvar-vos? O sofrimento aperta-vos nos mercados, nas paragens, nas praças públicas onde vós crianças estendem os braços abraçados de caixas de qualquer produto em troca do centavo que a Dona Titia espera lá em casa. E o vosso salário é um centavo de meia colher de restos de comida, comida anoitecida, ou uma simples refeição de rale temperado com caldo calado de uma alimentação condígna! Adeus!!!

Adeus Inhambane, adeus mulheres da baía - mulheres artistas que nos arteliers de rochas, do mar entre berros das ondas pintam obras de ostras, ameijoas, caranguejo, camarão, peixe e entre outras beldades artísticas que enchem as montras dos estômagos em museus de alimentação;

Adeus a todas mulheres, mulheres artistas que pelas manhãs avançam firmes com o pincel da enxada para o artelier da terra produzindo obras de verduras, vegetais, legumes, cereais, tubérculos apreciadas pelos coleccionadores estomacais em museus da vida, onde curadores de exposições agrícolas aparecem com exuberantes técnicas de coloração verde;

Adeus Inhambane, adeus a todos homens e mulheres artistas...que esculpem obras de arte e cultura, de ciência, de política, de religião expostas nos olhos e nas mentes de qualquer apaixonado apreciador ou coleccionador;

Adeus homens que pelas manhãs, meio-dia e pelas tardes trepam coqueiros no carinho de carícias no sobe-desce em busca de obras de sura que enaltecem a nossa cultura nas adegas de convivios social;

Adeus Inhambane, adeus a todos curandeiros da minha terra que pelas tardes de pôr-do-sol ou pelas madrugadas esculpem obras de diálogos com os mortos, na mediação/criação de conflitos com os vivos em acordos de ku-phahla e de missas onde galinhas típicas, cabritos, ovelhas...são sacrificados, e seu sangue desce quentinho às cavernas espirituais para debelar a fome dos mortos. Adeus!

Adeus poetas e escritores da baía que saciam mentes de qualquer povo com pratos de obras que marcam o tempo e o lugar da nossa identidade..., com tempêros que percorrem a melancolia da inocência das mulheres idosas, viúvas, solteiras... que vestem capulanas de feiticeiras de próprios filhos para não falar de netos e até vizinhos ou qualquer outro familiar, na batucada da saga da terceira idade! Salute a essas dígnas obras de arte esculpidas nas oficinas de desumanização!!!

Adeus Inhambane; adeus o silêncio; adeus a tranquilidade; adeus a hospitalidade; adeus a humildade; adeus as lindas praias; adeus a diversidade cultural e; adeus Inhambane, minha, vossa e nossa província; minha, vossa e nossa cidade que vezes clama de uma melhor arte urbanizadora entre os bairros em expansão esculpidos de ruas apertadas e tortas se bem que existem!

Adeus Inhambane, especialmente aos coveiros muito mal bem remunerados e tratados pelos empregadores e pela sociedade, que mais que ninguém, são eles os construtores de palácios onde repousam os nossos mortos. Esses mortos que meia volta estão connoscos nas festas de reconciliação. A vós coveiros que vos cabe a arte da coragem e de humilhação vai o meu obrigado pela inspiração. Esperem ainda mais o meu agradecimento quando o sino da minha badalada zombar pela madrugada ou pelo pôr-do-sol... Porque afinal de contas morrer é esta arte de divagar na vida, somando dias menos dias até que a força de renúncia da contagem atinge-nos, e a máquina calculadora fica com os outros que também vão passando para outras mãos;

Embora ainda não tenha subido-te ao palco para declamar-te a poesia da nossa nascença, da governação política, da governação divina, da governação de nossos espíritos ou da morte, da governação social e cultural, isso não importa. O importante é dizer-te que adeus Inhambane, amo-te e vou contigo no coração, pois tu inspiraste-me grandemente na aventura pelo mundo amador das letras...

Até mais!
Joaquim Chau
Inhambane, Agosto de 2011

quarta-feira, 27 de abril de 2011

“Revistando as Raízes I”, resposta da carta da mãe - número 1

Admiro imenso a sua alma militar, que nunca aceita ser vencida pela velhice, neste momente que te atenta para imobilizar-te. A tua determinação pela vida me faz viajar numa profunda reflexão sobre a minha personalidade!
A tua mente continua mais fresca que as de muitos jovens amadurecidos pelo envelhecimento precoce: álcool, nicotina, drogas pesadas neste mundo urbano em que tudo virou disputa pela sobrevivência.

Aqui na cidade as pessoas movem-se de um lado para o outro, entre temer a chegada do dia que sempre adia a sorte de achar qualquer coisa escondida algures que nem vossos tintlholos conseguem desvendar. O emprego virou diamante; a pobreza e o lixo tornaram-se abundantes mais que os próprios munícipes; a água escasseia-se e a qualidade de energia é uma autêntica mira para quem, mensalmente é obrigado a pagar a mesma factura; os impostos então, isso sim, aqui e acolá ouvem-se vozes vestidos de supremacia de colecta-los, me parece ser uma das guerras que o governo consegue ganhar para além da corrupção e nepotismo em que o povo vai perdendo sempre na tal pobreza!!!...

Fico feliz em saber que as coisas gatinham na nossa magna povoação e em particular nessa toca que me delira de saudades da minha adolescência. Muito bem me lembro daqueles velhos tempos em que tinha que sentar no meio de gente idosa, seguir o contorno das palavras...e traçar um discurso para alimentar as mentes dos que nem ler e escrever sabiam. As vezes as cartas eram de amor, tréguas, tristezas... Tinha que antes mergulhar na leitura silênciosa, encarnar a situação e erguer a voz para quebrar o silêncio vezes explodindo lágrimas ou sorriso. Lembro-me de um dia, depoís de violar o envelope, encontrei uma foto com uma cruz, por sinal era da pessoa que se pensava que tivesse sido ela a enviar a carta para os pais. Fiquei electrizado de medo, chamei a consciência ao serviço da coragem e consegui fingir que estava tudo bem sem antes passar a foto aos familiares. Enquanto mergulhava silenciosamente no conteúdo da carta, já no segundo parágrafo a consciência trai-me e deixei escorrer as lágrimas e logo interrompi a leitura para dar lugar aos gritos tentando balbuciar algumas palavras para os familiares... Imagina com aquela idade, mãe!!!

Mãe, parabéns pelo avanço na tentativa de resolver o problema do poço. Apenas algumas inquietações: será que assim está tudo resolvido ou falta dar outro passo? Qual foi a contribuição dos outros beneficiários?

Muito obrigado, por saber que mesmo dentro das nossas dificuldades financeiras conseguimos encher a mãe de orgulho, isso, particularmente para mim, me faz delirar de prazer. Na verdade sinto muito a tua falta, mãe! Ohhh, que bom que o abacaxi mostra sinais de progresso. Na verdade isso é mais para garantir o sustento da mãe.
O meu tempo é escasso, tenho mesmo que terminar a carta por aqui. Sei que ainda há muitos assuntos por se discutir, prometo que um dia a gente volte a ribalta. Fica bem!

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Revistando as raízes I - Resposta I

Querido Filho,

Muito obrigada, por ter recebido a tua carta. Penso que é uma boa iniciativa, já que o meu celular anda com problemas de bateria, como pudeste testemunhar. Filho, em nenhum momento as tuas cartas constituirão incomodo. Sabes que essa foi sempre a nossa prática, escrever cartas e esperar meses e meses para a carta chegar e obter a resposta. Foi atravês de cartas que comecei a comunicar-me com o teu pai, muito antes de o conhecer pessoalmente. Naquela altura, para nós que vivemos no campo, a carta era o único meio de comunicação com os demais familiares e amigos que se encontravam distante. Eu sei que tu sabes muito bem disso que estou falando. Tu próprio ajudavas algumas famílias na povoação a ler, traduzir e escrever cartas para seus familiares, lembras-te?...

As culturas estão saudáveis. Nesta época a chuva está brincando no chão. Como viste, o amendoím e o milho tem suficiente para servir de semente e de algum excedente até a outra época. O homem da tracção animal veio lavrar àquela parte que te falei, agora estou nos preparativos de sacudir o campím para que logo consiga lançar o amendoím, milho e estacas de mandioqueira. O teu abacaxi está saudável, penso que foi um bom investimento, filho, parabéns. O teu irmão Xidumo mandou algum dinheirinho para reforçar o pagamento das pessoas que têm me ajudado na machamba. Estou muito orgulhosa por vocês, filhos! Continuem assim, que sempre terão sorte por toda a vida!

Quanto à questão daquele assunto do curandeiro, ele veio. Foi uma grande dores de cabeça para reunir as pessoas, porque muitas delas já tinham desanimado do projecto do poço. Mas com um pouco de esforço foi possível convence-las. Procurou-se consultar tintlholo numa senhora vizinha. Inicialmente simulou uma negação de ajuda, mas graças a um ancião...convenceu a ela a estender-nos a mão.
E a questão que foi encontrada foi da tua madrasta, que com outra senhora que vive na outra povoação...tiraram areia do poço. E com a sua magia foram fazer tratamento para bloqueiar o processo de saída de água. Isso tudo foi em pleno dia, filho. Que coragem! Os tintlholos acrescentaram ainda que a tua madrasta está com inveja de mim, porque todos vocês trabalham e tentam oferecer-me uma boa vida! Eu não entendo porque as pessoas têm tanto ódio assim! Aquele poço não só é para o meu benefício, como também o é para outros membros da nossa povoação, sobretudo a vizinhança.
Foi uma tarde de muita agitação. Com essa minha idade em que o corpo começa a recentir-se da velhice, com muitas coisas juntas só para a minha cabeça, morro de incertezas de poder ter oferecido melhor vida para os meus filhos. Mas em fim, a vida é sempre esse constante equacionador de hipóteses que só são respondidas quando a própria vontade de viver falar bem alto...

Filho, por hoje é tudo. Continuo na expectativa de receber mais cartas tuas, elas me consolam como se tu estivesses ao meu lado, lembrando-me aqueles anos da tua infância que andavas no meu colo, gritando, pulando...

Da tua mãe,
Cailora Fainda

terça-feira, 22 de março de 2011

Revistando as raízes I

Prezada Mae,

A esta hora deves estar com a costela namorando a esteira do chão, com os braços atados na almofada que garantem o tombo da cabeça, mas porque as ordens de mãe-filho mandam, o que me resta é romper as barreiras impostas pela escuridão, encurtar a distância, esquivar a rota dos feiticeiros, fazendo chegar esta breve carta, que sem dúvidas já chega atrasadinha.

Mãe, a minha viagem correu muito bem, pelo caminho cruzei com um senhor que apreciou prazerosamente àquela fruta que me ofereceste, a melância. Interrompeu-me a marcha, questionou-me da minha proveniência e sobretudo da fruta. Dei-lhe todas as indicações para que pudesse chegar em casa saciar-lhe esse desejo. Será que lhe procurou? As maçarocas, o amendoím, a cacana e a hotaliça de feijão nhemba escaparam da gula dos olhos daquele monstruoso homem por estarem encolhidos silenciosamente dentro da mochila pelas costas.

Os chapas 100 comportaram-se bem, até que consegui chegar a casa sem nenhuma tagarelice dos mal educados de cobradores, exceptos a ventania e a poeira avermelhada que intalaram-me o corpo pela carroçaria, no delirioso chamboco dos buracos naquele trouço até a estrada nacional. Mas antes, dizer-lhe que naquele trouço de Cambine, vi montões de areia e homens parecendo estar a cavar a rua. A uma distância via-se uma enorme fila de mulheres carregadas de bidons de água. Fiquei com a memória estática! Mas uma voz feminina ao lado, socorreu-me gritando que aquelas mulheres vezes substituem o carro sisterna que quando quer avariar nunca avisa. Logo apercebi-me que eram dessas operações de reabilitação das vias de acesso, que em breve essa acção fará-se circular veementemente pelos órgãos de informação, congratulando os esforços feitos pelos nossos compatriotas, que vergonha, hein?!

Já na baía, o Barco Baía de Inhambane estava lotado e ensaiva a marcha de partida, tive que esperar uns 40 minutos pelo Barco Magulute, que parece ter sido eficiente. Nesse tempo, assistia aqueles bancos de areia despidos pela água, pescadores baloiçando nas canoas na caça do peixe que no final de cada jornada invadem os mercados para trocá-lo com alguns tostões para suprir suas necessidades. Também apreciava o movimento de outros passageiros que se punham em marcha naqueles barquinhos que jamais quero saber falar deles. Da próxima te conto sobre eles... O calor fazia daquele sábado um dia quente, impelindo aos corpos a refugiarem-se aos cânticos da brisa pelas lindas praias que esta nossa bela província oferece. Pena andar em contra tempo de não puder levar-te a uma dessas praias. Talvez um dia possamos pensar bem sobre isso, que achas?

Em casa a tua nora corria com seus afazeres quando lhe surpreendei com um bater manso da porta, que pela hora, não imaginava que pudesse ser eu, mas zás!!!...
Mas mãe, não se chateia que estou terminando esse fala-fala, o problema é que eu não consigo não contar-te tudo, ou seja, sintetizar não é nada comigo, isso é coisa de poetas que em três ou quatro palavras desenham a dimensão do significado de um determinado contexto...

As noites foram passando, mas sempre pensativo sobre aquela conversa que tivemos. Tentei a todo custo para examinar a situação, mas no fim de cada odisseia, parece que tinha que dar razão aos factos, aliás, essa nossa doutrina tradicional em que tudo tem base nas experiências do quotidiano, nos espíritos interpretados pelos curandeiros que são os guias da nossa relação com os defuntos e feiticeiros. Mãe, jurro que até hoje não entendo como é que uma pessoa, através da tal bruxaria pode barrar a saída de água naquele poço que homens e mulheres, debaixo do sol estão ardendo a pele e as veias na esperança de ver o líquido saindo, para minimizar aqueles doze quilometros em que a lata ferimenta a cabeça das mulheres e deixa os miolos bêbados e mais dopados para obediência dessa masculinidade socialmente poderosa? Será que o Nhamussoro já veio desvendar esse mistério? E como é que está o homem- máquina perfuradora, continua estatelado?
Por favor mãe, de-me notiícias. O facto de estar na cidade não significa estar desconectado da nossa tradição. Apenas é contra tempo que me faz ausente desses problemas, mas sabes que sempre que consigo biscateiar algum tempinho, encurto essa distância e apreço-me aos teus beijinhos, já que o abraço por nossa tradição é proíbido, isso é coisa de homem para homem.

Para terminar, gotaria tambem de saber, como é que estão as tuas machamabas? Será aquele homem de tracção animal conseguiu lavrar aquela parte que tinhas planos para semeiar milho e amendoím? Mãe, aprecio bastante a tua dedicação pelas machambas, semeias o teu suor sempre que o sol raia. Mas nao precisas exagerar muito, está? Gostei imenso ter revistado aquele ambiente de casa, embora não pudesse ficar mais tempo. Da próxima tento programar alguns dias para ficar mais um tempinho, penso que há muita coisa que precisamos partilhar.

Um beijo para ti! Adoro-te tanto, minha deusa!!!

Do teu sétimo filhote,

Joaquim Chau

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Ventos Ávidos

Não encontro outro meio se não este para junto partilhar as intuições que me coçam o pensamento noite e dia. Na arte de pensar reina complexidade, perplexidade e entre outros fenómenos. Isso revela as diferentes formas de concepção, análise, interpretação, percepção…de certos assuntos jazido em cada trecho vivido e, ou simplesmente ouvido ou observado esculpido de palavras. E para mim, em particular, escrever não é arte mas sim uma compaixão de aliviar-me a comichão do que penso através de palavras.

Será que sou o primeiro a sentir a brisa dos ventos que sopram pela África? Mas que ventos? A última questão interessa-me. E a segunda fica para o caro leitor. São ventos que sopram pela África cuja sua brisa coça-me o juízo de raciocínio: sopram-me bem alto em todas as frentes. Em todas as badaladas de sono onde a vigília acompanha-me até ao amanhecer. E aí deixo o espectro entrar: África já não quer esses estadistas excepto alguns. Esses dirigentes que mesmo com estatuto do que são: honras, glórias…ainda cultivam ódio pela coisa pública. Roubam-na. Esvaziam as barrigas do povo. E enchem-lhas de miséria, pobreza, analfabetismo, etc., fruto de inúmeras guerras, muitas delas desnecessárias… Outros governam-nos como se estivéssemos em prisão perpétua. Alteram constantemente as constituições para que possam se deliciar cada vez mais das honras do poder…

Esses não! Não! Não! Não são dirigentes, estadistas, políticos…para dirigirem esta África. Esta África, que pedaço a pedaço, de banquete em banquete, vai sendo usurpado pelos asiáticos, pelos europeus, e porque não pelos americanos? Não meu povo, esses dirigentes não! Esses dirigentes não queremos em África! África quer correntes políticas coerentes, activas e proactivas. Capazes de promover uma democracia inclusiva e transparente, que se aplique no quotidiano dos próprios africanos. África quer correntes políticas de oposição maduras e endurecidas pelas verdadeiras injustiças sociais. Isto é, uma democracia africana, que possa seguir os modelos e a realidade de África. E não a maioria desses actuais que se apunhalam pela conquista ou partilha do poder. Que sempre a intenção é odiar a coisa pública.

Esses não, África! Isso não, África! África precisa de homens construídos da sensibilidade humana. Que se opõem á escravidão actual do homem comum; que se opõem ao saque dos recursos naturais; ao enriquecimento ilícito de certas figuras… incluindo altos magistrados da nação; ao derrame de sangue do povo em troca da miséria; aos abusos de poder; à corrupção; à censura da liberdade; etc., esses sim, são verdadeiros homens. Homens construídos pelo sentimento de igualdade. Uma igualdade para toda a humanidade.

África quer correntes religiosas de sua África. Correntes maduras e realísticas. Isentas de hipocrisias, hipnotismos e adestramentos de crentes inocentes de seus intentos obscuros embrulhados na palavra divina. África quer seu próprio deus. E não deus de ventos ávidos. Nem que seja um deus pobre… mas que seja um deus que ensine a verdade aos seus crentes africanos. África quer mudanças na religião. Não quer religiões importadas como mercadorias que andam de lés a lés á procura de comprador. África Clama por uma religião com uma base teológica que respeite e domine as esferas sociológica e antropológica do seu povo. África quer liberdade religiosa.
África quer super-homens. Estadistas formados ou com consciência mais complexa sobre os valores, deveres e direitos da humanidade que a dirige. África quer super-homens construídos pelo sangue da ciência de governação humana.

África quer correntes jovens. Mas não jovens corrompidos pela fama. Porque a fama é uma forma de destruição da virtude consciente do homem. Pois esse famoso passa ser viciado. Quer que todos o esculpem palavras de elogios. E assim fica apreensivo aos elogios que desaguam na fama. África quer jovens comprometidos com a resposta aos problemas do seu meio. Jovens capazes de influenciar, advogar…a revisão de políticas desajustadas. Nem que seja pela dança; pelo canto; pela guitarra ou pelo batuque; pela escrita; pela tela; pelo teatro; pelos discursos dirigidos…mas é preciso que cada um se sinta comprometido com a mudança de África e em particular deste Moçambique. E se cada um se sentir comprometido, todos agiremos em consonância ao despojo de todos males que enfermam a nossa bela e rica África.

Temos que deixar de ser carruagem, carretas… que simplesmente seguem um condutor que mostra caminho. Que mesmo num caminho espinhoso, esburacado, lamacento seja qual for entramos e de viva voz gritamos: está tudo bem!!!!!!!!!!!!!!! Mas será???



Joaquim Chau

quinta-feira, 11 de março de 2010

Pompa de Ordenamento Urbano ou Urbanizar o desordenamento Urbano

A música da pompa de ordenamento urbano ou urbanizar o desordenamento urbano é cantada pelos senhorios de alguns municípios. É uma canção entoada apenas para garantir-lhes o prestígio de terem sido indicados pela confiança política e da legitimação que o povo lhes concedeu através de sistemas de votação para gerir os municípios. Bem hajam essas políticas e critérios que permitem a ascensão de sedes distritais/vilas a categorias de municípios que, neste momento, estamos ao número 48 municípios num total de 128 distritos. Mas não basta apenas ter-se políticas e critérios, é preciso que na vila transformada hajam outras políticas e critérios técnicos engajados na verdadeira transformação económica, habitacional, social, cultural e política. Nisso é preciso que se guerreie a política de improvisos, a extrema dependência de orientações políticas partidárias e, as virtudes de remendos. E se crie acções interventivas e inclusivas que possam olhar para o espaço em expansão da urbe como epicentro das atenções para a sua constante e imutável transformação, para que a espécie humana chamada a habitar tenha condições humanamente habitáveis. É preciso que a máquina da urbe viaje pelas maravilhas do pensar para que possa buscar um raciocínio transformador dos problemas da urbe em desafios sustentáveis e realizáveis.

Se a urbanização significa o processo de transformação das características rurais de uma zona para as características urbanas, é preciso que se compreenda que esse fenómeno está associado ao desenvolvimento da civilização e da tecnologia, através de esforços sincronizados/combinados para dotar a zona de infra-estruturas (ruas, estradas, escolas, hospitais, bancos, parques infantis, mercados, esgotos, água, electricidade, etc., etc. e serviços básicos necessários: transporte, educação, saúde, segurança pública, etc.) de uma forma (co) ordenada e organizada no caso de infra-estruturas.

Nas nossas vilas transformadas ou aquelas concorrentes a categorias de urbe, nota-se uma extraordinária ausência, salvo algumas, de esforços planificados e conjugados na estetização no âmbito da expansão urbana. O que se verifica até certo ponto é a pompa de urbanizar o desordenamento urbano mantendo rigorosamente as características rurais nas zonas ditas urbanas.
Caros presidentes das urbes, não basta só parcelar ou atribuir títulos de uso e aproveitamento de terra aos munícipes, colocar água e energia, é preciso que hajam planos ou seja projectos desenhados que estruturem a futura zona a ser transformada em bairro dentro da urbe. É preciso que haja no terreno, um serviço de fiscalidade presente e actuante, de forma a corrigir anomalias que dia-a-dia vão surgindo, exemplo: espaços reservados para ruas e de outros serviços públicos ocupados, construções desordenadas, etc. Para isso, é preciso antes, urbanizar intelectualmente todos os intervenientes envolvidos no processo e, em particular os dos departamentos da urbanização, incluindo os presidentes das urbes, os chefes dos postos administrativos, os responsáveis dos bairros e porque não os próprios munícipes? Desmantelar a ganância, as armadilhas ao suborno, a corrupção, entre outros males que se encontram urbanizados nas mentes dos principais intervenientes no processo de urbanização da urbe. Tem que se levar os bairros da urbe ao espelho de vossos rostos para que todos os dias possam-se espelhar com orgulho de uma realidade que compense a vossa existência como gestores municipais.

Há evidências de urbanização do desordenamento urbano. As vilas sedes dos distritos de Funhalouro e Mabote são um exemplo claro das evidências em causa. Nota-se um esforço enorme feito no parcelamento de terrenos com dimensões bem largas – ideais para suplantar infra-estruturas habitacionais ou de serviços. Em contra partida, nesses mesmos parcelamentos, não há regras de jogo, se existem, não são respeitadas para ordenamento das construções que com o tempo vão surgindo. Algumas estão em frente das outras, outras ainda sem qualidade. As infra-estruturas de comércio informal vão tomando conta do espaço no coração das vilas. Nalgumas vezes aparecem de forma desorganizada. Aonde é que vamos com estas vergonhas? Onde estão os departamentos de planificação administrativa/urbana? Onde estão os gestores máximos dos distritos e respectivas sedes? Não sentem remorso de estarem a promover o desordenamento urbano?

Na capital provincial de Inhambane, notam-se também evidências de crescimento ou expansão urbana. Surgem bairros novos nos arredores da cidade mãe. São bairros que vão surgindo e expandindo-se à maneira de Inhambane, aos olhos nus do organismo da urbe. É evidente que muitos desses bairros têm água e energia, mas será que basta? Se tem água e energia já não se pode dizer o mesmo em relação aos arruamentos. A esse aspecto é um autêntico caos, se não vejamos: em alguns desses bairros em muitos casos, as casas dos munícipes não tem acesso a carros. As ruelas que existem terminam num certo ponto. E dai os munícipes deixam os carros e completam a distância a pé. Já outra situação é que algumas dessas ruelas não são estreitas ou seja não foram planificadas. E às vezes só tem uma faixa de rodagem. Já se imaginou a ginástica que se faz quando no meio os carros se cruzam? E quem faz a legalização desses terrenos uma vez que muitos tem marcos plantados? Onde está o departamento da urbanização? Qual é a sua política de urbanização? Afinal, que fazem com os valores cobrados para a legalização dos terrenos e de licenças de construção?

Entende-se que a situação da cidade de Inhambane é diferente doutros sítios. Enquanto noutros sítios os munícipes com a terra apenas fazem machamba, em Inhambane não é apenas isso. Plantam-se coqueiros, cajueiros, mangueiras, etc., que são as riquezas (benfeitorias). Mas isso não pode constituir pretexto para que o poder da pompa de urbanizar o desordenamento urbano esteja nas mãos dos detentores das benfeitorias. O estado detém o poder absoluto para regrar qualquer que seja a actividade exercida pelos cidadãos num determinado espaço (país, província, distrito, posto administrativo, localidade, bairro e quarteirão), tanto que especificamente na questão da terra é a sua pertença, pode, sem dúvidas, negociar com os detentores das benfeitorias as regras, critérios, requisitos básicos que devem ser observados em caso de cedência dessas benfeitorias para terceiros.

Caros presidentes das urbes, caros administradores, uma das riquezas de Moçambique é a vasta terra que o país possui: terra para agricultura, agropecuária, implantação de infra-estruturas, exploração mineira, etc., que, tendo em conta a CRM, a mesma é pertença do Estado. Cabendo ao mesmo estado o papel de regulador para aquisição, uso e aproveitamento da mesma, é necessário que os titulares de poderes de atribuição de títulos de terra sobretudo no que concerne a habitação, tenham também poderes de fiscalização interventiva para garantir que essa mesma terra esteja a ser usada e aproveitada seguindo os padrões e obrigatoriedades estipulados pela urbe ou pelo organismo de tutela. É preciso que rigorosamente se acompanhe o processo de expansão urbana, isto é, conceber e projectar as áreas em expansão, definir o padrão de casas em cada área e garantir que os munícipes/cidadãos cumpram com as exigências do estabelecido. Só assim teremos bairros arejados e confortáveis para uma vida municipal desejável.
Há também uma extrema necessidade de se olhar o próprio centro da cidade/vila como um sítio em permanente (re) construção. Muitas infra-estruturas já deram o seu tempo de vida; o parque automóvel está em constante crescimento; etc; nisso é preciso que se olhe para todos os aspectos e (re) desenhe-se acções de constante manutenção seja dos esgotos, estradas, ruas, edifícios públicos, praças públicas, jardins, parques infantis, etc.
Coloca-se também outro desafio que é o de reestruturar os bairros que eram na altura suburbanos. E agora, com a crescente expansão das cidades, encontram-se no meio entre os bairros do centro da cidade e as das zonas em expansão. Nesses bairros está instalado um autêntico caos de desordenamento urbano. Quase que não há ruas, os terrenos não estão devidamente parcelados apesar de alguns legalizados; há problemas sérios de saneamento do meio…isso talvez tenha-se causado pela guerra que, nessa altura, as pessoas procuravam sítios com maior segurança. Depois da guerra, alguns retornaram as zonas de origem enquanto que outros preferiram ficar, tendo por conseguinte, negociado a compra ou cedência das benfeitorias (espaço/talhão) com respectivos proprietários. Nesse processo não havia árbitro que pudesse regrar o jogo. As coisas foram acontecendo até aos dias de hoje. E a intervenção do município é indispensável e urgente para controlar a situação.

…por uma liderança da urbe proactiva, capaz de operar mudanças rumo a promoção de crescimento ordenado e organizado da nossa urbe


Inhambane, Março de 2010
Joaquim Chau